REZANDO COM O EVANGELHO DO DIA
(LECTIO DIVINA)
Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm.
Sexta-feira da 15ª Semana do Tempo Comum
1) Oração
Ó Deus, que mostrais a luz da
verdade aos que erram
para retomarem o bom
caminho,
dai a todos os que professam
a fé,
rejeitar o que não convém ao
cristão,
e abraçar tudo o que é digno
desse nome.
Por nosso Senhor Jesus
Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
2) Leitura do Evangelho (Mt 12, 1-8)
1Atravessava
Jesus os campos de trigo num dia de sábado. Seus discípulos, tendo fome,
começaram a arrancar as espigas para comê-las. 2Vendo isto, os
fariseus disseram-lhe: Eis que teus discípulos fazem o que é proibido no dia de
sábado. 3Jesus respondeu-lhes: Não lestes o que fez Davi num dia em
que teve fome, ele e seus companheiros, 4como entrou na casa de Deus
e comeu os pães da proposição? Ora, nem a ele nem àqueles que o acompanhavam
era permitido comer esses pães reservados só aos sacerdotes. 5Não
lestes na lei que, nos dias de sábado, os sacerdotes transgridem no templo o
descanso do sábado e não se tornam culpados? 6Ora, eu vos declaro
que aqui está quem é maior que o templo. 7Se compreendêsseis o
sentido destas palavras: Quero a misericórdia e não o sacrifício... não
condenaríeis os inocentes. 8Porque o Filho do Homem é senhor também
do sábado.
3) Reflexão Mateus 12,1-8 (Mc 2,23-28; Lc 6,1-5)
* No evangelho de hoje veremos de perto um dos muitos
conflitos entre Jesus e as autoridades religiosas da época. São conflitos em
torno das práticas religiosas daquele tempo: jejum, pureza, observância do
sábado, etc. Colocados em termos de hoje seriam conflitos como, por exemplo,
casamento de pessoas divorciadas, amizade com prostitutas, acolher os
homossexuais, comungar sem estar casado na igreja, faltar à missa no domingo,
não fazer jejum na Sexta-feira Santa. São muitos os conflitos: em casa, na
escola, no trabalho, na comunidade, na igreja, na vida pessoal, na sociedade.
Conflitos de crescimento, de relacionamento, de idade, de mentalidade. Tantos!
Viver a vida sem conflito é impossível. O conflito faz parte da vida e já
aparece no nosso próprio nascimento. Nascemos com dor de parto. Os conflitos
não são acidentes na estrada, mas são parte integrante do caminho, do processo
de conversão. O que chama atenção é a
maneira como Jesus enfrenta os conflitos. Na discussão com os adversários, não
se tratava de ele obter razão contra eles, mas sim de fazer prevalecer a
experiência que ele, Jesus, tinha de Deus como Pai e Mãe. A imagem de Deus dos
outros era a de um juiz severo que só ameaçava e condenava. Jesus procurava
fazer prevalecer a misericórdia sobre a observância cega de normas e de leis que
não tinham mais nada a ver com o objetivo da Lei que é a prática do amor.
* Mateus
12,1-2: Colher trigo em dia de sábado e a crítica dos fariseus
Num
dia de sábado, os discípulos passavam pelas plantações e abriam caminho
arrancando espigas para come-las. Estavam com fome. Os fariseus chegam e
invocam a Bíblia para dizer que os discípulos estão cometendo uma transgressão
da lei do Sábado (cf Ex 20,8-11). Jesus também usa a Bíblia e responde evocando
três exemplos tirados da Escritura: (1) de Davi, (2) da legislação sobre o
trabalho dos sacerdotes no templo e (3) da ação do profeta Oséias, ou seja, ele
cita um livro histórico, um livro legislativo e um livro profético.
* Mateus
12,3-4: O exemplo de Davi
Jesus
lembra que o próprio Davi também fez uma coisa proibida pela lei, pois tirou os
pães sagrados do templo e os deu de comer aos soldados que estavam com fome (1
Sm 21,2-7). Nenhum fariseu teria coragem de criticar o rei Davi!
* Mateus
12,5-6: O exemplo dos sacerdotes
Acusado pelas autoridades religiosas, Jesus argumenta a partir do
que elas mesmas, as próprias autoridades religiosas, fazem em dia de sábado. No
templo de Jerusalém, em dia de sábado, os sacerdotes trabalham muito mais do
que nos dias de semana, pois devem sacrificar os animais para os sacrifícios,
devem limpar, varrer, carregar peso, degolar os animais etc. E ninguém dizia
que era contra a lei, pois achavam normal. A própria lei os obrigava a fazer
isto (Nm 28,9-10).
* Mateus
12,7: O exemplo do profeta
Jesus cita a frase do profeta Oséias: Quero misericórdia e não sacrifício. A palavra misericórdia significa ter o coração (cor) na miséria (miseri)
dos outros, ou seja, a pessoa misericordiosa deve estar bem perto do sofrimento
das pessoas, deve identificar-se com elas. A palavra sacrifício significa fazer
(fício) com que uma coisa fique
consagrada (sacri), ou seja, quem
oferece um sacrifício separa o objeto sacrificado do uso profano e o distancia
da vida diária do povo. Se os fariseus tivessem em si este olhar do profeta
Oséias, saberiam que o sacrifício mais agradável a Deus não a pessoa consagrada
viver distanciada da realidade, mas sim ela colocar o coração inteiramente
consagrado para aliviar a miséria dos irmãos e das irmãs. Eles não teriam
condenado como culpados os que, na realidade eram inocentes.
* Mateus
12,8: O Filho do Homem é dono do sábado
Jesus termina com esta
frase: o Filho do Homem é dono até do sábado! Jesus, ele mesmo, é o critério da interpretação da Lei de Deus.Jesus
conhecia a Bíblia de cor e salteado, e a invocava para mostrar que os
argumentos dos outros não tinham fundamento. Naquele tempo, não havia Bíblias
impressas como temos hoje em dia. Em cada comunidade só havia uma única Bíblia,
escrita a mão, que ficava na sinagoga. Se Jesus conhecia tão bem a Bíblia, é
sinal de que ele, durante os trinta anos de vida em Nazaré, deve ter
participado intensamente da vida da comunidade, onde todo sábado se liam as
escrituras. A nova experiência de Deus como Pai fazia com que Jesus chegasse a
descobrir melhor qual tinha sido a intenção de Deus ao decretar as leis do
Antigo Testamento. Convivendo com o povo da Galiléia durante trinta anos em
Nazaré e sentindo na pele a opressão e a exclusão de tantos irmãos e irmãs em
nome da Lei de Deus, Jesus deve ter percebido que isto não podia ser o sentido
daquelas leis. Se Deus é Pai, então ele acolhe a todos como filhos e filhas. Se
Deus é Pai, então nós temos que ser irmãos e irmãs uns dos outros. Foi o que
Jesus viveu e pregou, desde o começo até o fim. A Lei deve estar a serviço da
vida e da fraternidade. “O ser humano não foi
feito para o sábado, mas o sábado para o ser humano” (Mc 2,27). Foi por causa da sua
fidelidade a esta mensagem que Jesus foi preso e condenado à morte. Ele
incomodou o sistema, e o sistema se defendeu, usando a força contra Jesus, pois
ele queria a Lei a serviço da vida, e não vice-versa. Ainda falta muito para
nós termos a mesma familiaridade com a Bíblia e a mesma participação na
comunidade como Jesus.
4) Para um confronto pessoal
1. Que tipo de conflitos você vive na família, na
sociedade e na igreja? Quais os conflitos em torno de práticas religiosas que,
hoje, trazem sofrimento para as pessoas e são motivo de muita discussão e
polêmica? Qual a imagem de Deus que está por trás de todos estes preconceitos,
normas e proibições?
2. O que o conflito já
ensinou a você nestes anos todos?
Qual a mensagem que você tira de tudo isto para as nossas comunidades de
hoje?
5) Oração final
No meu leito te recordo,
penso em ti nas vigílias noturnas,
pois tu foste meu auxílio;
exulto de alegria à sombra de tuas asas.
A ti está ligada a minha alma,
a tua mão
direita me sustenta. (Sl 62, 7-9)
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